Citemor 2003


  ©

MIGUEL BORGES E AMÉRICO SILVA

A FESTA DE SPIRO SCIMONE


Sex 25, Sab 26 e Dom 27 Jul | 22:30 | Teatro Esther de Carvalho

residência de criação, estreia

Para nós, o problema do teatro não é não se saber falar, é antes do mais, não saber ouvir. Se não sabes ouvir, não sabes falar.

Spiro Scimone


SETE PERSONAGENS COM AUTOR

Nunca ninguém esteve mais sozinho num palco do que as personagens de Spiro Scimone. É o que apetece dizer quando vemos esta galeria mínima de sete personagens que o siciliano criou nas três peças que até agora fez (Nunzio  de 1994, Café  de 1996 e A Festa de 1999). Esta solidão profunda e intocável é a solidão de quem está longe de casa, no gélido apartamento alugado da cidade do norte para onde os levou a emigração (Nunzio), as traseiras de arruinado café familiar ( Café), mas também pode ser, como em A Festa, o interior  da casa, o próprio coração da família. Foi aí que as sete personagens de Scimone entraram e tomaram a palavra. Elas e os que estão fora, rondando a casa, bandidos, mulheres sem cuecas, assassinos, mandantes, empresários, traficantes.

Estas personagens estão sozinhas, fechadas entre três paredes, vivendo a horas mortas, madrugadas, noitadas, chegando a adormecer em cena. Vêm não se sabe de onde, encontraram-se por acaso, ou por natureza estão condenadas a estar ligadas. como estes pai, mãe e filho da terceira peça, filho que se chama Gianni, assim estabelecendo laços com os bandidos aludidos nas primeiras peças, pai que perde o dinheiro ao jogo como Petru no Café, mãe que em tudo se mete como a ausente mãe de Café. 

Ao isolamento linguístico das primeiras peças, escritas num messinês de fantasia, responde Scimone em A Festa, com personagens que falam na língua comum, o italiano. Mas, como ele próprio no-lo disse, em Julho de 2002, há aqui umamusicalidade que se percebe que vem da mesma mão que escreveu Nunzio e Café. São palavras italianas, embora construídas num modo de dizer meridional. São sicilianas, são minhas, pertencem-me.” Já não há, aqui na Festa, aquele “mesmo discurso linguístico que une as personagens, as liga, as isola dos outros”. Os traços de ligação entre estes três ainda são mais neutros, o mundo parece ter-se nivelado, estes três já nem trazem da sua terra o saboroso queijo.

Embora, como diz Scimone, ele tenha apostado em “com as palavras italianas, criar um texto, uma musicalidade, como fiz com o dialecto”. 

E estas personagens sozinhas que dizem pouca coisa, que  a repetem, que insistem, que voltam atrás, que dizem quase nada, continuam. Nada da ternura com que, em Nunzio,  o assassino e o operário se unem contra o mundo, nada do jogo permanente entre dois esquecidos como em Café,  já não há jogo neste Fin de Partie, as personagens já quase não se falam, ou falam por interposto membro da familia, prolongam até ao fim da noite os seus lugares-comuns, interrompidos de vez em quando pelas recordações da Mãe, a única personagem com direito a tirada, quando conta histórias de chapéus e camisolas cinzentas.

Seco, mais austero, mais nu, mais cru ainda do que nas outras peças, mais geométrico, mais impassível, Scimone atinge em A Festa  a depuração de linhas da mais imparável tragédia.  

De onde nos falam estas personagens? Para lá do tempo? Para lá da morte?

E esta família pobre e sem nada mais do que a sua nudez está aqui isolada, sem mais nada, refugiando-se na casa-palco, como aquela que, vinda também da vulcânica Sicília, se abrigou num palco à procura de Autor. 

É que a vida fugiu, se foi.

Jorge Silva Melo


A peça é apresentada em Lisboa no Teatro Taborda de 4 a 12 de Setembro.

texto Spiro Scimone

tradução Jorge Silva Melo 

com Miguel Borges, Américo Silva e Pedro Carraca

cenografia e figurinos Rita Lopes Alves 

assistente cenografia Thomas Kahrel

montagem José Manuel Reis e Luís Dias

luz Pedro Domingos

trabalho de Miguel Borges e Américo Silva com assistência Alda Moreira

produção TÁ SAFO /Artistas Unidos / Citemor

estrutura financiada pelo MC / IPAE

apoios Casa do Povo da Glória do Ribatejo e CAVES VELHAS


> Bilhete: € 10 Bilhete com desconto: € 7

(desconto aplicável a menores de 25 anos, estudantes e profissionais das artes do espectáculo)