Citemor 2020

Sex 31 Jul 22:30 - Montemor-o-Velho

IGNASI DUARTE + GONÇALO M. TAVARES

CONVERSAS FICTÍCIAS #45

© Susana Paiva

Um escritor responde em cena a perguntas que ele mesmo formulou a personagens das suas obras.

Primeira aproximação ao teatro automático

Quando decidi baptizar os meus argumentos teatrais com o nome de automáticos, e daí essa etiqueta de teatro automático - algo pomposa e, talvez, susceptível de gerar demasiadas expectativas -, foi exclusivamente porque a ideia de automático me remetia para o mecanismo de um revólver. Dias depois prossegui com a analogia, os atributos de um revólver revelaram semelhanças com aspectos intimamente relacionados com o teatro, como estava a tratar de redefini-lo há vários meses. O teatro, entendido como um artefacto portátil, directo, espontâneo, eficaz, letal, intrigante, etc., possuía inegáveis similitudes com uma máquina de matar.

(…)

O palco representa uma derrota. A derrota do indivíduo perante a sua incapacidade para controlar os acontecimentos, o devir. A vida e a morte.

Conversas Fictícias é a primeira aproximação à ideia de um teatro automático, fundamentada, como dizia, numa conversa em que os dois interlocutores assumem papéis bem distintos: um dirige a conversa fazendo perguntas, enquanto que o outro unicamente responde. Um jogo com apenas uma regra. Eu dirigo o interrogatório formulando a um escritor perguntas que ele mesmo escreveu para as personagens das suas obras; perguntas todas elas contidas nos seus livros. É assim que me transformo numa espécie de doppelgängerque devolve ao escritor a sua imagem reflectida em cada uma das perguntas que lança. Deste modo, o autor não elaborará o discurso partindo da sua literatura, mas respondendo às perguntas reescreverá a sua obra, refundando-a num novo relato cénico. O escritor torna-se então actor do seu próprio drama: a sua ficção aprisiona-o e converte-o em mais um dos seus personagens. E por detrás da máscara goza de maior liberdade para responder a questões por vezes comprometedoras que, tempo atrás, deixou por resolver, endosando-as às suas personagens.

Uma tentativa de (re)escritura escénica onde a dramaturgia se constrói ao vivo: impossível de ensaiar, impossível de simular, impossível falhar. Um relato que nenhum dos dois intérpretes sabe até onde pode ir nem como se desenvolverá.

Conversas Fictícias é um exercício de apropriação literária cuja finalidade não é representar ou adaptar um texto à cena, mas obter um novo relato a partir da mesma literatura, dos seus restos. Um posicionamento que revela a natureza do projecto como um instrumento de criação em si mesmo.

IGNASI DUARTE

© Susana Paiva

Já se realizaram três “Conversas Fictícias” com Gonçalo M. Tavares: Paris, Montemor-o-Velho e Barcelona em 2016.

Esta sessão no Citemor (no Festival Y, Covilhã, a 5 de Agosto) pretende ampliar o material recolhido com vista à produção de um livro a partir da cena.

Autor do projecto e Interpretação Ignasi Duarte

Escritor convidado Gonçalo M. Tavares

www.conversasficticias.com